domingo, 15 de dezembro de 2013

Regulação hormonal da ecdise em insetos

Quem nunca achou, caminhando pela floresta/mata, alguma exúvia de cigarras presas nos troncos ou galhos das árvores? 
Imagem 1 - Representação do mecanismo de crescimento dos insetos, a ecdise
http://www.brasilescola.com/upload/e/cigarra_exoesqueleto.jpg

Pois é, este é um mecanismo natural realizado por alguns organismos como os Arthropoda, por exemplo. Este fenômeno, denominado de muda ou ecdise, permite que os artrópodes troquem o exoesqueleto velho por um novo permitindo o crescimento destes organismos. É válido ressaltar que o exoesqueleto é formado por quitina (polissacarídeo), sendo produzido pela epiderme.

Imagem 2 - Representação esquemática do exoesqueleto de um artrópode
http://www.biologia.blogger.com.br/Artropodes%203.jpg

Para compreendermos melhor este mecanismo, explicitaremos sobre quais os hormônios estão envolvidos neste  processo de muda (ecdises) dos insetos.  

            Os hormônios, de uma maneira geral, são produzidos pelas glândulas endócrinas e são lançados no sangue para agirem em suas células alvo, regulando as atividades celulares. Nos insetos, a produção hormonal ocorre nos centros neuronais, neuro-glândulares ou glandulares, como as células neurossecretoras, as “corpora cardíaca”, as “corpora allata” e as glândulas protorácicas (HARTENSTEIN, 2006, apud, GARCIA 2012).

            As células neurossecretoras (CNS) encontram-se por todo o sistema nervoso dos insetos, em sua maioria no cérebro. O sistema nervoso central produz grande parte dos hormônios conhecidos, com exceção do hormônio juvenil e ecdisteróides, que são produzidos pelas “corpora allata” (ou “corpus allatum” quando as glândulas são fundidas) e glândulas protorácicas, respectivamente. As “corpora cardiaca” consistem em um par de corpos neuro-glândulares dispostos atrás do cérebro e responsáveis pelo estoque do hormônio protoracicotrópico (HPTT) (GARCIA, 2012).

            O HPTT é um dos hormônios mais influentes para a ecdise, sendo estas sintetizadas pelas células neurossecretoras e armazenado na glândula corpora cardíaca. Após a síntese o HTTP segue para a hemolinfa, tendo como efeito a estimulação da produção de ecdisona, esse hormônio, então, induz o processo de ecdise nos insetos. Após serem carreados por proteínas transportadoras de sua origem (glândulas protorácicas) até os tecidos periféricos é convertida em β-ecdisona, essa ativa as células hipodérmicas, restaurando assim a capacidade de produção das proteínas que formarão a nova cutícula e liberando a cutícula velha (apólise) (LEITE, 2011). Alguns pesquisadores apontam que a ecdisona é um hormônio hidroxilado, que apresenta estrutura similar aos esteróides presentes nos vegetais e animais.

            Pesquisas inferem que a liberação de ecdisteróides ocorre na forma de pulsos, antes de cada muda, sendo controlada principalmente pelo HPTT (Vafopoulou e Steel, 1989, apud GARCIA 2012). Tais pesquisadores ao estudarem sobre a influencia dos hormônios na ecdise de Rhodnius prolixus, observaram dois picos de ecdisona antes de cada muda. O primeiro ocorreu um dia após a alimentação, com um pequeno aumento da concentração de ecdisona na hemolinfa, enquanto que o segundo, bem maior, ocorreu no meio do processo de muda (VAFOPOULOU e STEEL, 1989 apud GARCIA 2012 ).



Referências:

GARCIA, E. S.; CASTRO, D. P.; FIGUEIREDO, M. B.; GONZALEZ, M. S.; AZAMBUJA, P. Sistema Neuroendócrino de Insetos. In: Vários autores. Tópicos Avançados em Entomologia Molecular. Brasil: Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Entomologia Molecular, 2012.
LEITE, L. D. L. Entomologia Básica. Apostila. ICA/UFMG

quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Os efeitos de agentes estressores em peixes

Hoje iremos refletir sobre o que ocorre com os peixes quando estão em condições de estresse...
            Primeiramente vamos compreender o que é ‘estresse’, do ponto de vista fisiológico. Estresse, segundo Mello (1999) representa uma condição em que o animal não consegue manter o estado fisiológico normal devido a fatores denominados estressantes, comprometendo assim a sua homeostase. Os agentes estressores em peixes podem ser de vários tipos, destacamos aqui alguns desses agentes: de natureza física como o transporte, confinamento; de natureza química como os contaminantes, o baixo teor de oxigênio ou pH da água: ácido ou alcalino, reduzido ou elevado; e percepção pelos peixes de predadores (SILVEIRA, 2009).
Imagem 1 - Representação de um peixe sob estresse http://www.forumamordepeixe.com.br/viewtopic.php?f=72&t=1440

            As respostas de estresse são divididas em três categorias, sendo estas primárias, secundárias e    terciárias. As respostas primárias são as hormonais, as secundárias são mudanças nos parâmetros fisiológicos e bioquímicos e as terciárias são o comprometimento no desempenho, mudanças no comportamento e aumento da suscetibilidade a doenças.
 Muitos pesquisadores apontam que os níveis de cortisol é um bom indicador para avaliar estresse nos peixes, sendo este um preponderante inibidor do desempenho reprodutivo de peixes desencadeado por estresse. Quando expostos a situações estressantes severas ou de longa duração, como por exemplo, exposição a metais pesados, mudanças bruscas de temperaturas, manejo e confronto com predadores, os peixes têm seus processos reprodutivos perturbados devido a alguns fatores como a depressão da  hipófise e de níveis plasmáticos de gonadotropinas, ao decréscimo de níveis de hormônios esteróides, à redução do tamanho dos ovos e da qualidade das larvas.  Outras ações do cortisol envolve a redução na taxa de crescimento e supressão das funções imune (LIMA et al. 2006).
O estresse inibe a taxa de crescimento através de efeitos sobre o metabolismo e alteração do sistema endócrino que regula o crescimento.  Pesquisas apontam que o Hormônio do Crescimento (HC), que está envolvido com o crescimento, em condições de estresse, tem sua secreção pela glândula pituitária, inibida. O estresse também pode exercer efeitos inibitórios do crescimento através da diminuição dos níveis plasmáticos dos hormônios T3 e T4, através da alteração do estado nutricional causada pela redução na quantidade de alimento ingerida induzida pelo estresse, também sendo observada influência do cortisol neste processo (OLIVEIRA & CYRINO, 1998).
A análise do cortisol plasmático é usualmente utilizada em peixes como indicador de estresse, independente do seu estágio de desenvolvimento. O cortisol age diretamente nas brânquias, intestino e fígado e refletem as duas maiores ações desse hormônio, ou seja, o controle do balanço hidromineral e do metabolismo energético.


Referências:
LIMA, L.C., Ribeiro, L.P., Leite, R.C, e Melo, D.C.. Estresse em peixes. Rev Bras Reprod Anim, Belo Horizonte, v.30, n.3/4, p.113-117, jul./dez. 2006.
OLIVEIRA, A.M.B.M.S, CYRINO, J. E. P., Estresse de peixe em piscicultura intensiva. Anais. Recife, 1998.
MELLO, R.F. Influência da suplementação da dieta com vitamina C no crescimento e resistência à hipoxia em alevinos de piaussu (Leporinus obtusidens). Piracicaba, USP, 1999. 41 p. (Dissertação mestrado).
SILVEIRA, U. S., LOGATO, P. V. R., PONTES, E. C. Fatores estressantes em peixes. Revista eletrônica Nutritime, v. 6, nº 4. p. 1001-1017, julho/agosto 2009


quarta-feira, 4 de dezembro de 2013

Neurônios - Espelho

Porque bocejamos quando vemos alguém bocejar? Porque ficamos com os olhos marejados quando vemos alguém chorando? Porque sorrimos quando vemos alguém sorrir? Você já parou pra pensar o que nos leva a agir de acordo com que os outros fazem?

Imagem 1 - http://www.caramujolouco.com/wp-content/uploads/2009/11/tn.jpg





Imagem 2 - http://neuropsicopedagogianasaladeaula.blogspot.com.br/2012/05/neuronio-espelho.html



Imagem 3 - http://www.nature.com/nature/journal/v452/n7189/images/452814a-i1.0.jpg


Isso ocorre porque quando observamos alguém realizar alguma atividade/movimento, ativamos no nosso cérebro os mesmo neurônios de quando somos nós que realizamos determinada ação. Esta capacidade se deve aos neurônios – espelho, os quais estão distribuídos em várias áreas corticais fronto-parietal (LAMEIRA et al., 2006). A compreensão sobre essas células cerebrais nos permitem entender o quão os neurônios – espelhos são importantíssimos no aprendizado de atitudes e ações, como conversar, caminhar ou dançar, ou seja, graças a essas células executamos determinadas atividades sem necessariamente pensar nelas, apenas acessando o nosso banco de memória.
Imagem 4 - http://www.paulada.com.br/tag/neuronios/

Os neurônios espelhos foram descobertos por Rizzolatti e colaboradores na área pré-motora de macacos Rhesus. Estes pesquisadores demonstraram que alguns neurônios da área F5, localizada no lobo frontal, que eram disparados quando o animal realizava um movimento com uma finalidade específica (como apanhar uma banana, por exemplo) também eram ativados quando o animal observava um outro indivíduo (macaco ou ser humano) realizando a mesma ação (LAMEIRA et al., 2006).
Imagem 5 - http://corticalchauvinism.wordpress.com/2013/01/23/mirror-mirror-on-the-wall-mirror-neurons-and-autism/

Estudos posteriores mostraram que nós também temos neurônios-espelho, sendo estes muito mais sofisticados e flexíveis que os dos macacos. Uma equipe de neurocientista da Universidade de Parma, coordenado pelo neurocientista Giovanni Buccino, usou Ressonância Magnética Funcional (RMF) para medir a atividade cerebral de voluntários enquanto eles assistiam a um vídeo que mostrava várias sequências de movimentos de boca, mãos e pés. Foi possível constatar que, dependendo da parte do corpo que aparecia na tela, o córtex motor dos observadores se ativava com maior intensidade na região que correspondia à parte do corpo em questão, ainda que eles se mantivessem imóveis.
Alguns pesquisadores apontam que durante a evolução humana os nossos ancestrais alcançaram dominância ecológica, mais explicitamente, por meio dos mecanismos cognitivos foi possível conseguir vencer as demandas seletivas apresentadas pelo meio ambiente. Complementando esta ideia, tais pesquisadores sugerem que a maior pressão seletiva enfrentada pelos nossos ancestrais a competição intra-específica. Esta pressão, decorrente da vida social, seria compartilhada com outras espécies que têm vida social complexa como os primatas não humanos. Sendo assim, se os nossos cérebros são um produto da seleção natural e se a sua história evolutiva foi caracterizada por influências decorrentes da vida social, deveríamos encontrar as marcas desta história nas características funcionais e estruturais da cognição humana. Uma dessas marcas, possivelmente, são os mecanismos de ressonância ou os supracitados neurônios – espelho (YAMAMOTO, 2007).
Tal mecanismo nos permite imaginar o que se passa na mente de outra pessoa, colocando-nos no lugar do outro, ou seja, compreendendo suas ações. Isso acontece, por exemplo, quando vemos uma pessoa chorar por algum motivo, os neurônios-espelho nos permitem lembrar das situações em que choramos e simular a aflição dela. Sentimos empatia por ela, sentimos o que a pessoa está sentindo. Pesquisadores apontam que os neurônios-espelho são um mecanismo-chave para a aprendizagem. Como exemplo temos as dos bebês que tem a capacidade de imitar expressões faciais dos adultos, produzindo instintivamente “caras e bocas”. Isso ocorre pois os neurônios-espelho começam a funcionar logo na primeira infância.
Imagem 6 - http://bocadementecapto.blogspot.com.br/2012/05/neuronios-espelho.html

Em síntese, os neurônios espelho foram associados as várias modalidades do comportamento humano: imitação, teoria da mente, aprendizado de novas habilidades e leitura da intenção em outros humanos, sendo que a sua disfunção pode estar envolvida com a gênese do autismo (GAWRYSZEWSKI, 2007).




Para melhor compreensão sobre os neurônios espelhos, assista este vídeo:




Referências:

GAWRYSZEWSKI, L. G., JR., A. P., LAMEIRA, A. P., Neurônios espelho. Palestra apresentada na 59ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), realizada no dia 12/07/2007.
LAMEIRA, A. P., GAWRYSZEWSKI, L. G., JR., A. P. Neurônios espelho. Psicologia USP, 2006, 17(4), 123-133.
YAMAMOTO, M. E., Neurônios espelho e autismo: o ponto de vista da psicologia evolucionista. Anais da 59ª Reunião Anual da SBPC - Belém, PA - Julho/2007.

domingo, 1 de dezembro de 2013

Ecolocalização



Ecolocalização

Hoje vamos falar sobre um surpreendente mecanismo utilizado por alguns animais para se defender e/ou capturar alimentos, trata-se da ECOLOCALIZAÇÃO.

            A ecolocalização é um mecanismo utilizado por alguns animais para detectar a posição e/ou distância de objetos através da emissão de ondas ultrassônicas. O funcionamento deste mecanismo é relativamente simples de se compreender: os animais geram ondas sonoras com frequência alta, normalmente acima da faixa de frequência audível, na altura do ultrassom. As frentes de ondas geradas se deslocam pelo meio, atingindo o objeto a ser identificado, retornando ao emissor que, simultaneamente, processa as informações recebidas identificando a posição do obstáculo (CUNHA, 2010).

            Os morcegos, por serem animais noturnos e não possuírem uma boa visão podem emitir sons em torno de 60.00 Hz, sendo estes organismos capazes de voar no escuro total, conseguindo desviar dos obstáculos presentes em seu caminho e até mesmo caçar presas em movimento (Fig. 1). Estes organismos utilizam-se do que a literatura denomina de sonar, o qual consiste de um mecanismo de ecolocalização baseado na percepção da posição de objetos no espaço pela geração de um som e recaptura do mesmo após reflexão. (VATER & KÖSS, 2008, apud, RODRIGUES, 2010). 

Fig. 1 - Esquema de ecolocalização em morcego


Nos mamíferos, de uma maneira geral, a energia sonora emitida no ambiente chega até o tímpano pelo canal auditivo, o qual faz parte da orelha externa. Essa energia, com todas as suas características de frequência e intensidade, é transmitida pelo tímpano aos ossículos da orelha média (martelo, bigorna e estribo), que farão a transmissão para a janela oval na cóclea, integrantes da orelha interna (RODRIGUES, 2010).

As células ciliadas responsáveis pela transdução da energia sonora em impulsos nervosos é denominada de mecanorreceptores e  localizam-se no órgão de Corti (Fig. 2) e seus cílios encontram-se imersos na membrana tectorial, uma estrutura rígida e fixa. A vibração da membrana basilar causa o deslocamento da base do órgão de Corti, mas não dos cílios dos mecanorreceptores, o que gera um movimento relativo da célula em relação aos cílios (RODRIGUES, 2010).
 
Figura 2 - Representação do órgão de Corti, (Extraído de RODRIGUES, 2010).

             
Os cílios possuem canais iônicos de potássio o qual encontram-se parcialmente abertos em repouso, de forma que mesmo na ausência de som no ambiente o nervo coclear possui uma taxa basal de disparos de potenciais de ação. O movimento relativo dos cílios, bidirecional, leva a aumento do influxo de potássio, pelo estiramento da membrana em uma direção, e fechamento dos canais em outra, causando despolarização e hiperpolarização do potencial de repouso do receptor. Essa alteração na atividade eletrofisiológica modula a quantidade de neurotransmissor liberado na fenda sináptica e, consequentemente, a resposta dos neurônios ganglionares que integram o nervo coclear (Kandel e col., 2000).


As fibras nervosas que integram o nervo coclear não projetam-se diretamente para o Córtex Auditivo Primário (A1), mas passam por núcleos do tronco encefálico, onde há sinapses entre fibras provenientes de ambas as cócleas e importantes para processamento da origem de uma fonte sonora (ângulo da fonte em relação ao indivíduo). Assim como no sistema visual, todas as fibras atingirão o tálamo, mais especificamente o Núcleo Geniculado Medial (NGM) onde há novas sinapses para retransmissão da atividade eletrofisiológica para A1 (RODRIGUES, 2010).
Fig.3 - Trajeto percorrido pelas fibras nervosas
provenientes da cóclea até o córtex auditivo primário no
cérebro (Extraído de Lent 2006).